Você – que nos lê – com certeza tem algum hobbie: ler, escrever, ir ao cinema, jogar videogame, correr, bordar. Além de normal, é saudável exercer atividades distintas do trabalho cotidiano. Contudo, há pessoas que escolhem hobbies incomuns para desestressar, atividades que se tornam verdadeiras paixões e praticamente impossíveis de serem dispensadas.
O executivo Geraldo Guimarães Jr, 48 anos, é um deles. Para relaxar, ele precisa de altas doses de adrenalina. Praticante de paraquedismo há 17 anos, o vice-presidente para América Latina da multinacional alemã Elster Integrated Solutions afirma que não há stress que resista à atividade. “Para mim, além de ser uma diversão extremamente prazerosa, o paraquedismo é uma forma de aliviar o stress da vida profissional”, confessa, dizendo que saltar de três a cinco vezes num sábado ou domingo, o deixa mais do que preparado para enfrentar uma semana de trabalho e viagens.
Na companhia em que trabalha, o cargo do executivo exige assumir riscos, tomar decisões rápidas, gerenciar fatores externos e ainda comandar equipes de alta performance. Ele conta que no paraquedismo não é diferente, e que a atividade o ajudou a evoluir profissionalmente. [Sinto que] “Quando saltamos, passamos pelas mesmas situações, só que em um ambiente mais crítico ainda, onde a vida está em risco, por ser um esporte radical.”
A prática do esporte começou por influência de um colega de trabalho, Gastão Jucá – que ele considera o seu "guru". “No trabalho, ele me mostrava fotos e filmes, e fui me empolgando”. Um dia, a convite do amigo, ele foi ao Aeroclube de Belém assistir a uma atividade e, desde então, não se desvencilhou mais do paraquedismo. “Nesse dia me inscrevi no curso ASL (Automatic Static Line), onde o salto é a 4.000 pés, com paraquedas redondos, de um avião para quatro pessoas. Desde então, já saltei mais de 700 vezes, e não penso em parar”, assume.
Da diversão à prática profissional, Guimarães já participou de dois times de paraquedismo: o Agora Vai e o Parazão, nos quais conquistou o segundo e o terceiro lugar, respectivamente, no campeonato brasileiro de 400Way (evento em que os paraquedistas formam figuras pré-estabelecidas em queda livre. O executivo conquistou, ainda, o primeiro lugar no campeonato de duplas e também o recorde sul-americano de uma formação de 102 paraquedistas brasileiros em abril deste ano, na cidade de Eloy, Arizona, EUA.
O mais curioso, além de Guimarães praticar o esporte radical para relaxar é o fato do executivo assumir – sem pudores – o seu medo de altura. “Sempre tive medo de altura. Já parei brinquedos do Parque de Diversões de Nazaré com medo e paguei um grande mico na roda-gigante do Hopi Hari na frente da minha filha, que na época tinha quatro anos e me acalmava conforme a roda ganhava altura”, conta. “No paraquedismo, sempre sinto medo na hora de sair do avião, quando a porta se abre, mas o grande barato acaba se tornando uma terapia. É dominar o medo e se lançar”, explica. Apesar do medo, Guimarães nem cogita a possibilidade de deixar o esporte. “Acho que se eu parar, morro de tédio. Enquanto tiver saúde, quero continuar saltando”, conclui.
No mesmo caminho de Guimarães, o professor de educação física e sargento do exército Bruno Borges, mais conhecido como Bruno Aventura, 32 anos, também é adepto de esportes radicais como forma de relaxar. A paixão começou ainda criança, quando ele fazia trilha com amigos e a família. “Eu acompanhava meu irmão em aventuras pela natureza e também surfava. Apesar dos meus pais não serem muito aventureiros.”
Entre as atividades praticadas e oferecidas pelo Bruno, no Amazônia Ventura estão: rapel, tirolesa – uma técnica usada para transpor pessoas entre um ponto e outro, fixada por uma corda ou cabo-de-aço –, arvorismo, canoagem, paraquedismo, trilhas ecológicas, trilhas de bike, passeio de barco, orientação com mapa e bússola, sobrevivência na selva, expedição de aventura, entre outras; todas realizadas em contato com a natureza. “Cada uma dessas atividades, cada momento, é sempre mágico. Na hora, até dá medo, por conta da adrenalina, mas depois é curtir o relaxamento de ter cumprido mais uma missão”, afirma.
Para quem pensa em começar a praticar os esportes, Bruno alerta: “É um amor que não tem volta. Quem pratica atividades em contato com a natureza, se vicia e não consegue mais parar.”
O corpo, o canto e a guitarra
Além do contato com a natureza, as formas artísticas também são válvulas de escape muito utilizadas para aliviar tensões do cotidiano. A profissional formada em contabilidade, direito, gestão imobiliária e professora universitária, Elana Greice Arruda, 48, é uma delas. Dançarina flamenca há 11 anos, ela se divide entre as profissões, a dança e a família.
A atividade combina, essencialmente, o canto, o baile (dança) e o toque da guitarra. Juntando os três elementos, nasce o flamenco. Elana explica que o elemento final que caracteriza a dança é o chamado ‘duende’. “Para despertar o seu duende, o bailaor – bailarino – deve sentir a música e expressar, por meio de cada movimento, seus sentimentos”, explica.
No flamenco, há reuniões chamadas de juerga, que normalmente começam com um encontro no qual as pessoas conversam, comem e tomam vinho. “O mais importante em uma juerga é a espontaneidade da forma de expressão artística; por isso, o evento não pode ser planejado ou forçado. As festas geralmente se estendem por toda a noite e o baile é repleto de força, paixão e altivez. O flamenco é música, alegria e felicidade”, explica apaixonada, a dançarina.
Com muito controle do corpo, força nas pernas, Elana diz que a dança além de relaxar, a deixa mais disposta para o dia a dia e para a vida. Integrante do Cia de Dança Flamenca do Pará, ela já viajou para representar a companhia em outros estados. “Tenho um grande apoio, pois muitas pessoas admiram a prática, tanto família e amigos, quanto o meu marido, que é o meu maior incentivador”, destaca.
O vigor da dança flamenca, segundo Elana, favorece a disciplina, determinação, atitude e organização profissional. O entusiasmo da dançarina é tanto, que ela afirma que seria uma realização de vida poder se dedicar integralmente à arte.
Em outro oposto, ao pensamento de se dedicar e não à paixão pela arte, o professor de língua portuguesa, advogado, músico, astrólogo e baterista do Álibi de Órfeu, Rui Paiva, 45 anos, afirma que apesar de também ser um apaixonado pela bateria, não conseguiria fazer somente isso na vida. “Eu me sentiria inseguro sendo somente baterista. Como diz o Paulinho da Viola: ‘As coisas estão no mundo. Eu é que tenho de aprender’, destaca.
Paiva começou a tocar bateria aos 14 anos, por influência dos Beatles, Bach e Wilson Simonal, mas primordialmente por apoio dos seus pais. “Quando decidi aprender o instrumento, eles me apoiaram, ao contrário de muitos dos meus amigos, que não tinham apoio em casa por conta do estigma de ser músico”, relembra.
Devido às dificuldades, o baterista foi autodidata na aprendizagem do instrumento. “Não existiam professores de bateria em Belém na década de 80, por isso teimei em ser guitarrista. Quando percebi que minha vocação era bateria, não pensei duas vezes em mudar.”
Hoje, além de ser um hobbie, ser baterista tornou-se uma profissão, além de e também uma atividade indispensável para Paiva. “Tocar bateria é muito relaxante e pode ser um grande diferencial durante o dia de um executivo, por exemplo. Quando acabo de tocar em um show, é muito bom. Faz bem para tudo, desde o lado físico até o lado psicológico. A música é uma das maiores razões que fazem a vida ter sentido.”
Contudo, se você pensa que o amor do baterista pela música acaba aí, acredite: esse é só o começo. Paiva faz questão de destacar a importância da música para o desenvolvimento de uma sociedade. “Não há como dissociar o ser humano de sua capacidade de evoluir por intermédio dela, tanto que o próprio MEC (Ministério da Educação) quando estipulou as cinco competências do ENEM, destacou duas especialmente para a identificação das linguagens artísticas”, defende.
De fato, cada um tem sua forma particular e peculiar de relaxar, encontrar paz, sossego, de deixar – por um minuto – os problemas de lado. Na dança, no paraquedismo, na leitura, na música ou em contato com a natureza, o mais importante é descobrir o que relaxa você e se envolver de coração com essa atividade, porque, como disse Clarice Lispector: “O que importa afinal, viver ou saber que se está vivendo?”