Riso e improviso

Fernando Caruso provoca gargalhadas por onde passa. Profissional multimídia a serviço do bom humor, ele fala à Revista Leal Moreira sobre comédia e como o improviso requer muito treino

25/09/2012 12:16
Riso e improviso

Foi-se o tempo em que daria para dizer que Fernando Caruso está apenas aproveitando um bom momento. O ator, roteirista, diretor e comediante vem há anos se firmando no gosto do público e da crítica como uma das mentes mais criativas do humor brasileiro. Versátil, ele circula o país com o grupo de stand up comedy “Comédia em Pé” e o projeto de improviso “Z.E. Zenas Emprovisadas” (ao lado de talentos como Marcelo Adnet) – além de conceber e estrelar o programa “De Cara Limpa”, do canal pago Multishow. Em meio a toda essa correria, Caruso conversou com a Revista Leal Moreira.  Simpático e muito bem articulado, o humorista é daqueles que têm as respostas na ponta da língua. O resultado foi um papo sincero e divertido, como o próprio entrevistado. Confira:

Em que momento você percebeu que não era simplesmente uma pessoa divertida e resolveu transformar o humor em carreira?

Eu trabalhava como estagiário em uma agência de publicidade. Lá, se você ficasse parado, teria que investir no trabalho dos outros, e eu não era muito bom de fazer isso. Aí, aproveitei esse tempo pra começar a produzir as minhas peças, e isso foi rendendo muito mais. Foi aparecendo muito mais trabalho nessa área do que na publicidade. Então, foi acontecendo, não fui eu que decidi ser humorista. As circunstâncias me levaram a isso.

Você tem um programa de TV, um grupo de jogos de improviso, faz stand up comedy... Como é administrar tudo isso e quais as diferenças do processo de criação em cada um desses trabalhos?

Cada ideia vai para um canal diferente, né? O da televisão é o que eu mais tenho que sentar e preparar. Por exemplo, se eu penso em uma piada que envolve, sei lá, distribuir boias pras pessoas, eu preciso produzir isso: avisar o pessoal do figurino, providenciar as boias e tudo o mais. Se eu decido que vou entrevistar duas ou três pessoas, preciso estar com os microfones disponíveis pra todo mundo. Isso tudo eu tenho que planejar, passar pra produção... Isso é o que eu mais tenho que sentar pra fazer.

E os jogos de improviso, o stand up?

Para improvisação, o mais importante é treino. Juntar todo mundo, subir no palco e exercitar. Seja embaixo de sol, de chuva, de febre... A cabeça precisa estar sempre funcionando. Pro stand up, acho que é mais uma atenção mesmo. Aquela coisa de, quando surgir um assunto novo ou você contar uma piada, as pessoas rirem e você conseguir repetir esse resultado com outras pessoas. Eu compararia o stand up a uma espécie de colheita de piadas. As piadas acontecem e você tem que saber colocá-las no cesto e fazê-las renderem para virar uma bela salada de frutas (risos).

A televisão não é um limitador para a liberdade do improviso?

Depende do tipo de programa que você faz. Eu fiz uns programas na TV que eram muito parecidos com o meu processo de raciocínio no palco, no teatro. O teatro é vivo, você pode adaptar tudo o que acontece. Se você está fazendo uma peça e falta luz, você pode continuar falando sobre isso. Agora, se você está numa gravação e dá algum erro, provavelmente vão cortar esse erro e fazer de novo pra ir ao ar a parte certinha, né?

Como surgiu a ideia de levar para a televisão um formato como o do programa “De Cara Limpa”?

Eu dou aula de comédia há algum tempo. Eu estava com uns alunos que tinham feito um curso uma vez, pediram pra continuar e eu preparei um segundo módulo. Quando eu percebi que não tinha mais nada pra ensinar, brinquei que o módulo três seria de comédia de rua. Eu daria objetivos pra cada um e eles teriam que fazer pessoas estranhas na rua rirem disso.  Um dia, eu fui convidado pela Urca Filmes pra fazer um projeto pro canal Multishow. Acabei me lembrando dessa brincadeira e propus pra eles. Eles alavancaram a ideia e criaram o programa junto comigo.

Você se sente na obrigação de ser engraçado o tempo inteiro?

Quando eu estou no avião, no banco, não quero e não sou engraçado. No Rio, as pessoas são muito habituadas a encontrar gente que trabalha na televisão andando na rua, então é incomum que elas venham com esse tipo de abordagem. Quando eu estou viajando, é diferente. Se eu vou a uma cidade que não tem o hábito de receber pessoas da TV, isso rola. E se eu estiver afim desse tipo de interação também, aí eu vou pra rua, tranquilo. Agora, se eu não tiver, fico trancado no hotel. Acho que, se você está preparado pra variados tipos de situação, a questão não se torna um bicho de sete cabeças.

Você tem medo da rejeição?

Todo dia. Acho que é isso que move, inclusive. Todo dia eu penso “é hoje que vão me vaiar”. A gente nunca sabe se vai agradar. Às vezes, tem coisa que a gente acha que vai ser engraçado e a plateia não partilha desse sentimento. Isso muda de uma cidade pra outra, muda até de uma sessão pra outra. Eu sou inseguro o suficiente pra ir bem na primeira sessão e ficar pensando “será que eu vou bem na segunda?”. Eu sempre fico esperando qual o momento em que eu vou cair. Meu trabalho é evitar que isso aconteça.

Dentro do humor, o que faz você rir e o que você não acha nem um pouco engraçado?

Eu não gosto de piadas de bullying, de um modo geral. Não acho maneiro esse humor que agride as pessoas. Normalmente, eu fico mais do lado do agredido que do agressor. Não consigo rir, fico constrangido. Digo isso até de filmes, sabe aqueles que têm um cara que sempre se dá mal? Eu não consigo rir. Pra mim, é drama, eu sofro (risos). Agora, o tipo de humor que eu gosto mais é aquele universal, o humor que não precisa de muita referência pra você entender.     Eu gosto muito do Monty Python, que é um grupo de comediantes britânicos da década de 60 que tinha tudo pra não ter graça alguma e ainda hoje é engraçado. Não precisa ter lido o livro tal, visto o filme tal, saber quem é o ator que o comediante está imitando... É a piada pela piada. A piada pura é a que mais me move

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