Aristocrática, underground, efervescente, cinzenta, romântica, tradicional, punk. A icônica Londres carrega consigo toda sorte de adjetivos – frutos de sua história e de seus contrastes manifestos na arquitetura, nas pessoas, na música. Tudo é muito emblemático nessa senhora moderninha: do ônibus vermelho, passando pelo representativo Big Ben, à arrojada London Eye;a família real ao tradicional chá das cinco. A cidade que dirige na mão contrária da obviedade tem, na sua multiplicidade, o segredo que atrai mais de 27 milhões de turistas por ano. No próximo mês, um atrativo a mais vai redirecionar os olhos para o pedaço mais plural da Europa: Londres recebe as Olimpíadas de 2012 e estampa de vez sua estética na retina do mundo. O fotógrafo Fábio Pina visitou a cidade em uma de suas passagens pela Europa e registrou alguns desses aspectos tão marcantes por meio de sua abordagem pessoal.
Não é a primeira vez que Fábio lança mão do olhar de estrangeiro sobre outro lugar. No ramo há 14 anos e com passagem por diversas áreas da fotografia (como fotojornalismo, publicidade e registro de eventos e moda), o profissional exercita a subjetividade do seu modo de observar quando viaja. Ele já fizera o mesmo na “Cidade-Luz”, cujos ângulos registrados por suas lentes resultaram na exposição “Impressões de Paris”, realizada na Feira Pan-Amazônica do Livro em 2009. Porém, como a ida à capital da Inglaterra foi motivada por outra paixão, o ensaio apresentado nas páginas da Leal Moreira não havia sido planejado. “Fui para assistir a um show. Eu não sabia o que vinha pela frente”, relembra. Porém, o momento de lazer foi ofuscado pelo instinto de guardar, em imagens, o que lhe chamasse a atenção. “Quando o fotógrafo está de férias, continua fazendo o que faz no trabalho: fotografando”.
Como sua relação com o estilo londrino era de desconhecimento (“as coisas pinceladas pela mídia eram as únicas referências que eu tinha”, conta), Pina acabou optando por um itinerário tradicional. “A cena underground e a noite londrina foram uma grande lacuna nessa minha viagem. Acabei fazendo um roteiro muito típico de turista mesmo”. Curiosamente, estar na condição do visitante habitual fez com que ele se permitisse observar o seu redor de uma maneira peculiar, conseguindo enxergar, em meio aos cenários de cartão-postal, as sutilezas que os ressignificariam. “A diferença é que, quando olho um prédio, uma praça ou um ponto turístico tradicional, não procuro fazer o que já foi feito. O olhar não é esse”.
Para adquirir o tal do olhar próprio, explica, não é preciso muito, basta atentar ao que normalmente é posto na conta do banal, do cotidiano, do irrelevante. “Ver detalhes da arquitetura, incluir pessoas que humanizem o espaço, dando referências dos costumes. Quando isso não é possível, o ideal é encontrar o enquadramento mais marcante, ou seja, um ar de novidade ao que já foi visto e fotografado milhões de vezes”, ensina. Dessa forma, tudo é fotografável se quem comanda as lentes sabe a maneira certa de enxergar. E o melhor: quem determina essa maneira certa é quem tem a câmera na mão. “Tudo de novo que surge à sua frente oferece um incrível potencial”, resume.
Priorizar a essência dos pontos por onde passou fez com que Fábio abrisse mão de um equipamento rebuscado demais – o que dificultaria suas andanças pela cidade e, de quebra, produziria um resultado artificial. Assim, ele optou por um material reduzido que conseguisse captar o que houvesse de mais delicado sem minimizar a dimensão dos ambientes que, de tão famosos, estão presentes no imaginário coletivo do mundo inteiro quando se trata de Londres. “Usei três lentes no máximo, um flash e um mini-tripé. Só isso já dá um resultado muito bacana nas fotos, pois se consegue captar a imensidão dos locais”.
Esse jeito meio mochileiro de fotografar possibilitou a Fábio experimentar uma sensação de proximidade em relação à população. “Fiquei surpreso com a receptividade das pessoas ao serem fotografadas”, diz, emendando em uma análise da segurança nas capitais europeias: “Nos lugares em que estive, vi diversos turistas e outros fotógrafos andando com suas câmeras profissionais até tarde da noite, em locais de pouco movimento, de forma tranquila, sem preocupação com assaltos e furtos”, observa. Ironicamente, o único aspecto que o incomodou durante a produção deste ensaio foi justamente o espírito da segurança londrina. “Me senti vigiado. Tive medo de ser abordado por um guarda querendo saber para quê eu estava fazendo aquelas fotos”, diverte-se o fotógrafo.
Do charme da plural Londres, Pina destaca a convivência pacífica entre modernidade e tradição: “prédios seculares, alguns tão antigos quanto nosso próprio país, vizinhos de edifícios futuristas, como a famosa roda gigante London Eye... esse é o ponto mais marcante”. Convivência, aliás, é a palavra-chave para compreender uma cidade tão tolerante consigo mesma, adjetivável de maneiras opostas considerando onde quer que se olhe. Ao se permitir observar sem pressa todos os contrastes por ângulos novos, pode-se concluir, como o próprio fotógrafo resume de maneira simples e definitiva (conformeseu próprio trabalho) : “Londres é uma surpresa”.